Zambelli e Eduardo no exterior provocam o STF a agir
Medidas cautelares e prisões preventivas precisam ser embasadas em fatos individuais e concretosEpisódios recentes envolvendo bolsonaristas, como a fuga de Carla Zambelli (PL-SP) para evitar a aplicação da lei penal e a permanência de Eduardo Bolsonaro (PL-SP) nos EUA em ofensiva por sanções ao Judiciário brasileiro, aumentam a pressão sobre ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) para a adoção de prisões preventivas ou outras medidas cautelares contra acusados, avaliam especialistas ouvidos pela Folha.
Mas a decretação de ordens do tipo, de acordo com eles, precisa ser baseada em fatos individuais, contemporâneos e concretos para atingir figuras como Jair Bolsonaro (PL), ex-presidente acusado de liderar uma trama golpista para impedir a posse de Lula (PT).

Bolsonaro está com seu passaporte retido e atualmente nega a possibilidade de pedir asilo. Ele, porém, já admitiu a possibilidade publicamente. Em fevereiro de 2024, ficou dois dias na embaixada da Hungria depois de a PF ter retido seu passaporte em razão das investigações sobre a tentativa de golpe.
No relatório que resultou no indiciamento de Bolsonaro na trama golpista, a PF sinaliza que ele teria viajado aos EUA após perder as eleições de 2022 a fim de dificultar sua localização e a eventual aplicação da lei.
A deputada federal Carla Zambelli afirmou em pronunciamento no dia 15 de maio que "se acontecer de ter a prisão, vou me apresentar para a prisão".
No último dia 3, anunciou que saiu do Brasil e que não pretende voltar ao país depois da condenação a dez anos de prisão e perda de mandato por ter comandado uma invasão ao sistema do CNJ (Conselho Nacional de Justiça). Afirmou entender que, por ter dupla cidadania, é "intocável" na Itália, versão contestada por especialistas. Nesta sexta (6), ela disse ao G1 que pretende se apresentar às autoridades italianas para informar que está no país, regularizar sua situação e não ser considerada fugitiva.
Zambelli cita como referência para sua atuação Eduardo Bolsonaro, que se licenciou do mandato de deputado federal em busca de sanções nos EUA especialmente contra Alexandre de Moraes e que se tornou alvo de um inquérito no STF pelos supostos crimes de coação, obstrução de investigação e abolição violenta do Estado democrático de Direito.
Tanto a situação de Zambelli quanto a de Eduardo compõem contexto para embasar um pedido de medida cautelar contra Bolsonaro, apresentado pelo líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias, junto à PGR (Procuradoria-Geral da República), segundo apurou a colunista Mônica Bergamo.
No pedido, Lindbergh afirma que o ex-presidente "tem adotado posturas públicas e privadas que denotam periculosidade processual concreta" e que Zambelli e Eduardo são "investigados em procedimentos análogos e possuem conexão direta com Jair Bolsonaro". "É preciso evitar que ele fuja como a Zambelli", diz no documento.
Para especialistas ouvidos por meio de comunicação nacional, a atual fuga de Zambelli para o exterior e o caso de Eduardo acendem um alerta no Judiciário, somados aos casos de outros bolsonaristas —como o blogueiro Allan dos Santos, que vive nos EUA e é considerado foragido no Brasil, e Oswaldo Eustáquio, que se mudou para a Espanha e virou alvo de tentativas sem sucesso de extradição.
Luisa Ferreira, professora de direito penal da FGV Direito SP, fala em "tendência" entre bolsonaristas de sair do país e alegar perseguição política. O que, na sua interpretação, poderia provocar o STF a ser mais rígido em relação à aplicação de medidas cautelares contra os investigados.
"Acho que esse movimento vai levar, no futuro, a um escrutínio mais rígido do STF, que, é muito possível, desde já aplique prisão preventiva e medidas cautelares", diz.
A especialista, entretanto, afirma que um pedido de preventiva precisa ser feito a partir da circunstância concreta do investigado. "Não posso aplicar uma preventiva no Bolsonaro dizendo: ‘a Zambelli fugiu’", explica.
"Para que isso pudesse servir de fundamento, teria que haver indícios de que o ex-presidente também está planejando algo no sentido de sair do país", completa Ricardo Yamin, doutor em direito pela PUC-SP.
Yamin, entretanto, concorda que a recente movimentação entre bolsonaristas pode intensificar o escrutínio da Justiça.
"Com certeza isso acende um alerta. Mas já adianto que ele já está aceso na PGR e no Supremo há muito tempo. Desde que o Bolsonaro foi visitar a embaixada da Hungria, desde a ida dele aos Estados Unidos na época da eleição", diz.
Juliana Izar Segalla, doutora em direito constitucional pela PUC-SP e professora da Universidade Estadual do Norte do Paraná, concorda que a Justiça fica em alerta com os casos, mas também diz que o Ministério Público só pode pedir medidas como a prisão preventiva em última instância.
"No processo penal, a gente vai em busca de uma verdade real, do que realmente aconteceu com cada um desses réus. Então não dá, por conta de alguns casos, de repente começar a decretar a prisão preventiva de todo mundo."
Fonte: Revista40graus e colaboradores