'Abin paralela' fez reunião para 'virar eleição' de 2022 indica investigação

Ideia teria sido discutida por coordenador-geral de departamento para favorecer Bolsonaro dê um con
Redação

Trocas de mensagens e um depoimento registrado no inquérito da chamada "Abin paralela" indicam que o coordenador-geral de operações da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) em 2022, no governo de Jair Bolsonaro (PL), sugeriu aos subordinados uma operação para tentar "virar a eleição" a favor do então presidente.

Em mensagens obtidas pela Polícia Federal, um servidor da Abin relata a um colega que o coordenador Alan Oleskovicz teria convocado três subordinados para uma reunião em que "ficou elucubrando uma operação 'que poderia virar a eleição'".

A troca de mensagens ocorreu em 3 de agosto de 2022, dois meses antes do primeiro turno das eleições gerais, quando Bolsonaro aparecia atrás de Lula (PT) nas pesquisas de intenção de voto.

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Foto: Rubens Cavallari
Camiseta em apoio a Jair Bolsonaro (PL) durante a campanha eleitoral de 2022 à venda na rua 25 de Março, em São Paulo

Pesquisa Datafolha divulgada em 28 de julho daquele ano, seis dias antes da suposta reunião na Abin, mostrava Lula com 47% das intenções de voto, contra 29% de Bolsonaro.

"[Oleskovicz] chamou 3 da equipe de CI [contrainteligência] do Doint [Departamento de Operações de Inteligência] (do último concurso) e ficou elucubrando uma operação 'que poderia virar a eleição'", escreveu um oficial de inteligência por WhatsApp a um colega.

Oleskovicz foi indiciado por peculato e prevaricação no relatório de investigação da PF. Meio de comunicação nacional procurou o agente, mas não houve resposta até a publicação deste texto. Os nomes dos demais personagens são omitidos da reportagem, pois eles atuam sob sigilo funcional.

Na mensagem, o servidor da Abin afirma que os três colegas que teriam participado da reunião o procuraram, depois do encontro, para "relatar o BO", em referência ao episódio, que consideraram problemático.

Segundo o oficial, o coordenador-geral tentaria convencer o então secretário de Planejamento e Gestão da Abin, terceiro cargo mais alto da agência, a apoiar a missão.

"Cara, é isso. Não é à toa que [ele] é coordenador-geral. Não tenho nada contra bolsonaristas, mas ele talvez seja tipo aqueles da seita. É evangélico, conservador... Aí afunda a agência inteira com ele", respondeu o interlocutor do agente, também por mensagens.

O plano de interferir na campanha eleitoral foi reforçado pelo depoimento de um servidor, em dezembro do ano passado. O oficial de inteligência relatou à PF ter ouvido o episódio de um colega, que teria relatado que a equipe de análise do departamento ficou horrorizada.

Segundo a versão que chegou ao depoente, em determinada reunião com outros departamentos, o coordenador teria dito que o trabalho de operações seria importante para ajudar na campanha do governo.

O coordenador-geral, de acordo com o depoimento, era vinculado a aliados do ex-diretor-geral e hoje deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ). Além de coordenador-geral do Departamento de Operações de Inteligência, um dos mais importantes da agência, ele foi diretor substituto da área em 2022.

Ramagem faz críticas à investigação da PF e atribui as conclusões do inquérito a uma "rixa política".

A sugestão dada pelo coordenador-geral da Abin aos subordinados voltou a levantar suspeitas sobre uma declaração de julho de 2022 do ex-ministro Augusto Heleno, do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), ao qual a agência estava subordinada no governo Bolsonaro.

Durante reunião ministerial, Heleno falou em "montar um esquema para acompanhar o que os dois lados" estavam fazendo, citando uma possível "infiltração desses elementos da Abin em qualquer dos lados".

Bolsonaro interrompeu o então ministro e pediu para que os dois conversassem de forma reservada em outro momento.

Em depoimento ao STF (Supremo Tribunal Federal) no último dia 10, Heleno afirmou que não é tecnicamente possível fazer a infiltração de agentes a curto prazo e que conversou com o então diretor da Abin para evitar possíveis ações violentas contra os candidatos. O general só respondeu às perguntas feitas pelo próprio advogado.

Ramagem deixou o comando da Abin em abril de 2022 para disputar as eleições. Até o final do governo Bolsonaro, a agência ficou sob o comando de Victor Carneiro, aliado dele e ex-superintendente no Rio de Janeiro.

O relatório da PF sobre a "Abin paralela" foi tornado público pelo STF nesta quarta-feira (18). Tanto o coordenador-geral citado como Ramagem e Victor foram indiciados.

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