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Congresso sob Bolsonaro impôs conta de R$ 82 bi a Lula

Aumentos de transferências para estados e municípios no Fundeb e reforma tributária pressionam gestõ
Redação

Alvo de questionamentos do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, as PECs (propostas de emenda à Constituição) aprovadas pelo Congresso sob o governo Jair Bolsonaro (PL) para elevar os repasses a estados e municípios custaram R$ 82 bilhões ao governo Lula (PT) em três anos. As medidas pressionaram mais as contas pública na gestão atual do que na anterior, quando foram votadas.

Em reunião com líderes dos partidos e presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado, Haddad apresentou a planilha de gastos das PECs do Fundeb (Fundo de Valorização da Educação Básica) e do FPM (Fundo de Participação dos Municípios). Segundo ele, responsáveis pela compressão das despesas discricionárias.

"São despesas contratadas quatro, cinco, seis anos atrás, e que a conta está chegando sem que a fonte de financiamento desta despesa tenha sido contratada no mesmo momento", disse Haddad à imprensa. "Às vezes vejo no jornal que ‘ah, está tendo uma gastança’. Mas quando foi contratado o gasto?", questionou.

Foto: ReproduçãoApresentação feita pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a deputados e senadores sobre o impacto das PECs do Fundeb e do FPM nas contas públicas
Apresentação feita pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a deputados e senadores sobre o impacto das PECs do Fundeb e do FPM nas contas públicas

O discurso foi utilizado pelo ministro para justificar a necessidade de um novo pacote de aumento de impostos para cobrir esses gastos. No entanto, o próprio Haddad deixará uma conta ainda mais salgada: os fundos regionais da reforma tributária custarão R$ 158,5 bilhões ao próximo presidente eleito (2027-2030).

O cálculo é da IFI (Instituição Fiscal Independente) do Senado, que alerta, desde a época da aprovação da reforma, para os riscos fiscais embutidos pelo Congresso para que governadores aceitassem a extinção do ICMS e o fim da guerra fiscal.

"A reforma tributária não demonstra ter potência suficiente no médio prazo para suportar, por conta própria, os custos adicionais gerados pelos dois fundos criados diretamente pela PEC 45/2019, e menos ainda para suportar os desembolsos dos outros dois fundos que tiveram a criação autorizada", disse a IFI em estudo divulgado em 2023.

Sob Lula, o gasto total com esses fundos será de "apenas" R$ 25,5 bilhões, de acordo com a instituição. O Executivo classificou esse valor como despesa financeira, fazendo uma manobra para excluí-lo das metas fiscais. Isso empurrará o impacto da medida para 2027, quando o fundo for usado para compensar as empresas.

O próximo governo ainda terá de arcar com crescimento anual de R$ 8 bilhões, entre 2027 e 2030, até os valores começarem a subir em ritmo menor, de R$ 2 bilhões ao ano (cifra que será corrigida pela inflação). Em 2043, prazo em que os repasses vão parar de crescer, serão R$ 106,7 bilhões a mais por ano em transferências obrigatórias.

Ex-secretário da Fazenda de São Paulo, Felipe Salto diz que as três PECs são uma contribuição do Congresso para o ajuste fiscal, "mas com sinal trocado". "A reforma saiu muito cara para uma transição longuíssima, em que o IVA [Imposto de Valor Agregado] no destino só será alcançado, de fato, num horizonte muito distante. Mas o custo será imediato. Tanto que o fundo já está contando com a primeira tranche [parcela] e o sistema só começa a mudar no ano que vem", diz.

Esses fundos servirão para compensar as empresas pela redução gradual dos incentivos tributários estaduais e para desenvolver os estados economicamente, de modo a atrair empresas e empregos. Além disso, há dois outros fundos, voltados à região Norte, ainda sem regulamentação.

Aliados de Haddad pontuam que, inicialmente, a conta seria muito menor, de R$ 40 bilhões em 2033. Mas o Senado impôs um valor de recursos quase duas vezes e meia maior para os estados e foi necessário aceitar esse acréscimo para a reforma ser aprovada. Meio de comunicação nacional procurou a Fazenda, que não quis comentar.

Foto: Lela Beltrão -16.jun.25/DivulgaçãoO ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), questiona despesas contratadas no governo Bolsonaro, mas que afetaram mais as contas sob Lula
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), questiona despesas contratadas no governo Bolsonaro, mas que afetaram mais as contas sob Lula

 

O Congresso também foi responsável por impor ao governo Bolsonaro dois aumentos de gastos, com o Fundeb e o FPM. PECs são promulgadas pelo Legislativo e o presidente não tem poder de veto. A equipe econômica da administração anterior optou, então, por diluir as despesas ao longo do tempo, fazendo os valores afetarem mais as gestões seguintes.

No caso do Fundeb, o impacto orçamentário nos quatro anos do governo Bolsonaro foi de R$ 16 bilhões. Sob Lula, somou R$ 69 bilhões nos três primeiros anos, valor quatro vezes maior. Só em 2026, a União precisará desembolsar R$ 38 bilhões a mais do que o previsto pela regra antiga —Haddad tenta convencer o Congresso a evitar essa última alta.

Presidente da Câmara na época, o ex-deputado Rodrigo Maia afirma que o governo Bolsonaro era contra a votação. "Não dá para culpar o [ex-ministro da Economia] Paulo Guedes. O processo foi liderado por mim na Câmara, com a bancada da esquerda e da educação", diz.

Segundo Maia, a intenção era chegar a um texto que priorizasse o repasse das verbas atrelado à melhoria da qualidade do ensino, mas a ideia acabou vencida pelo lobby dos professores, e a transferência ocorreu desvinculada de metas de resultado. "Agora, se há um erro na conta [do impacto fiscal], que se resolva isso numa nova PEC", afirma.

Embora o governo Bolsonaro tenha atuado para travar o aumento do Fundeb no começo, ele declarou apoio à PEC na hora da votação e buscou registrá-la como uma "marca da direita na educação pública".

Uma das principais consequências foi o aumento do piso salarial nacional dos professores de R$ 2.886,24 para R$ 4.867,77, aumento de 68% em cinco anos.

Já a PEC que determinou aumento escalonado do FPM foi aprovada na gestão do ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL), durante a marcha dos prefeitos à Brasília, também com apoio de todos os partidos, da direita à esquerda.

Guedes se opunha a essa PEC, mas a conta ficou praticamente toda para o governo seguinte. A gestão Bolsonaro teve aumento de apenas R$ 1,2 bilhão em suas despesas. O governo Lula, só em 2026, terá que pagar R$ 9,7 bilhões a mais para o fundo dos municípios, segundo a IFI. Em quatro anos, serão R$ 22,7 bilhões.

Gabriel Leal de Barros, economista-chefe da ARX Investimentos, rebate Haddad e diz que grande parte da dificuldade atual foi causada pela PEC da Transição, que elevou o gasto em quase 2% do PIB (Produto Interno Bruto) para 2023. "É uma abordagem passiva, não adianta culpar os governos e Congresso pelos problemas atuais."

O governo Bolsonaro também utilizou o Congresso para fugir de seu próprio ajuste fiscal e aprovar um pacote eleitoral que jogou despesas para a gestão seguinte, como a redução de impostos estaduais sobre energia e combustíveis.

O ex-presidente ainda teve apoio para aprovar a PEC dos Precatórios, que deu calote em dívidas judiciais da União e adiou seu pagamento para 2027, de modo a abrir espaço para outras despesas. Atualmente, Lula quita essas dívidas fora das regras fiscais, o que tem agravado o déficit nas contas públicas.

Fonte: Revista40graus e colaboradores

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